sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Por que é tão difícil viver "nos dias de hoje"?


Não é possível que apenas no século XXI as pessoas se perguntem isso. Conforme o tempo passa, as respostas podem ir mudando de estrutura, forma e conteúdo, mas sempre, sempre haverá uma resposta digna e coesa. Antes era porque as mulheres não eram respeitadas, então elas tomaram parte no campo de batalha e afrontavam os homens, até que chegamos na Era em que homens e mulheres perderam suas vozes.
Na infância, ninguém acredita em nós porque somos muito pequenos para termos um senso crítico. Na nossa adolescência, nem nós mesmos podemos acreditar que pensamos isso ou aquilo, nem que já tenhamos agido de tal forma, imagina se as outras pessoas nos levarão à sério. Quando adultos, por favor, “todo mundo mente”. Então, por que é tão difícil viver “nos dias de hoje”?
Porque as pessoas param de amar. Não me refiro só a relacionamentos, mas ideais, perspectivas de uma vida em potencial que elas não querem mais lutar para ter. Atualmente, se aprende em qualquer filme da Disney uma concepção de romantismo desde que nós somos pequenos humanos, e talvez isso nos deixe marcas sem retorno, mas é incrível como alguém se define através de seu desenho infantil, porque para todos é confortável falar de sua personalidade por metáforas. Princesas como Cinderela, guerreiras como Mulan, excluídos como Tarzan, brutos mas apaixonantes como Stitch. Atualmente, ser romântico é brega, e ainda que seja, ser romântico é um conceito um tanto expansível e avaliativo demais. Ridículo, muitos diriam. Talvez, os outros concordariam.
Porque as estações mudam dentro de nós. Às vezes somos verão, e não queremos nada por perto porque somos autossuficientes, embora vazios de grandes novidades. Às vezes somos outono, e conseguimos viver na nossa melancolia porque é nessa estação que colocamos nosso trabalho em dia e nos esforçamos até o último para não rompermos o ciclo do legado de nossas vidas. Às vezes somos inverno, tão carentes, mas não conseguimos assumir nem demonstrar, porque ao mesmo tempo somos tão gélidos. Às vezes, porém, também somos primavera, que é quando acabamos obtendo certa realização, o que causa alergia em alguns e alegria em outros. Com tudo isso, agora não é difícil entender como é complicado de se conviver, porque como podemos fazer para assimilarmos as estações e fazê-las se harmonizarem num mundo de pessoas distintas?
Enfim, porque as respostas jamais cessam. Varia de realidade, varia de experiência. Por que é tão difícil viver “nos dias de hoje”? Porque “tudo muda o tempo todo no mundo”.


quinta-feira, 1 de maio de 2014

Pode ser um gato.

       Vejo por aí que muita gente critica John Green de uma forma bem intensa, alegando que seus livros são previsíveis, muito "água com açúcar", puros demais para o cotidiano que encontramos fora daquelas páginas. Sabe, admiro John Green muito antes de os rumores sobre o lançamento de um filme com base no seu livro começar. Minha primeira dose se deu com "A Culpa é das Estrelas" confesso, que logo seguiu para "Cidades de Papel", "Quem é você, Alasca?", "O Teorema Katherine" e, por fim, "Will Grayson, Will Grayson", o qual é uma parceria de John Green com David Levithan, na verdade.
        Não foi difícil me apaixonar por cada personagem e logo me acostumar com a escrita de John Green. Cada metáfora, cada ironia, cada passo que quase podia sentir no chão à minha frente. Cada Mountain Dew bebido por seus personagens em todos os livros, despertaram em seus leitores a sua devoção. Muitos criticam isso também, que ele induz as pessoas a acreditarem nas suas teorias mais diversas, mas, ora, perdoem-me: ele apenas faz você ter curiosidade e refletir sobre elas.
       Ultimamente, então, peguei-me pensando sobre o último experimento citado no livro "Will Grayson, Will Grayson" que havia me parecido tão interessante. Mesmo sem muitas noções da mecânica quântica, os autores colocaram em questão a suposição de Erwin Schrödinger, lá em 1935. De uma forma bem básica, segundo o experimento dele, havia um gato dentro de uma caixa lacrada e, junto dele, um veneno letal ao gato e um martelo. O que decidiria se o frasco de veneno iria quebrar ou não, seria o mecanismo que está ligado ao martelo, que às vezes aciona, às vezes não. Segundo a física quântica, depois de um tempo dentro da caixa, o gato estaria tanto vivo quanto morto, os dois ao mesmo tempo, pois nunca poderíamos saber se o frasco foi quebrado ou não, a menos que tomemos a decisão de abrir a caixa e ver. E, sabe, não é o que acontece com nossas vidas, às vezes?
        Tudo bem que há momentos que não temos como sanar essa questão, como a espera do listão de vestibular em que o sim e o não são inerentes, mas tem situações que a gente pode sim abrir a caixa com nossas próprias mãos e ver o que acontece. Também concordo que uma faca de dois gumes um dia acaba por te fazer sangrar, mas viver naquele sim e não simultâneo não é uma boa forma de te privar de um momento que pode ser bom simplesmente com a suposição de que ele possa vir a não ser. 
         É só mais uma caixa, é só mais uma probabilidade, então por que não abrir e ver que o gato pode estar vivo?


sábado, 26 de abril de 2014

O dom do silêncio.

        Sabe quando o silêncio resume tudo o que você não quer falar? 
        Não parece muito comum estar num parque em que não se tenha barulhos abundantes. Num parque em que se possa ouvir os filhotes de labrador brigando por um graveto perto do chafariz, ou o arrulho dos pombos que apenas buscam por migalhas no chão, porém posso dizer que tive a sorte desta ocasião. Se havia pessoas lá? Claro que sim, amigos inclusive, mas acho que assim como eu, eles foram tomados pela miraculosidade daquele silêncio que, de tão natural, nos fez o aderir. Passamos a observar. As palavras, naquele momento, fariam o papel daquele chocolate granulado que já não gruda mais no brigadeiro porque ele já está muito bem coberto, seriam exacerbadamente  desperdiçadas. Somos, no final, também autores do silêncio.
        Era um pequeno estado de paz nos aconchegando no fim de uma semana, numa pequena tarde de sexta-feira em que o sol brilha apenas para deixar o outono com um toque de clássico, e digo até que muitos não têm essa virtude de se deixarem tomar por um sentimento tão puro. Reclamam do vento, do sol em seus rostos, do algodão doce que acabou, do carrinho de pipoca que range muito ao se deslocar. Elas não percebem que ao ventar, as folhas dançam no chão, que o sol bate em nosso rosto apenas para nos deixar um "oi" da estação que ele incide mais intensamente. Não percebem que às vezes acontece de o açúcar acabar e que há pessoas por aí que dariam muito para apenas saber que som faz aquele carrinho.
         Por isso, digo que momentos assim se assemelham a livros. Você deve ler com toda a concentração cada palavra, tirar suas conclusões subjetivas e cristalinas, porque normalmente ninguém deveria olhar pra ti e dizer como se sentir à respeito do que leu, muito menos do que viveu. Muitos leem rápido apenas para terminar, enquanto outros economizam cada página. Então, talvez depois de tudo, você tenha que fechar a contracapa e imaginar o que mais aconteceu com aqueles personagens, ou pegar um ônibus para casa e descobrir isso. Ainda assim, sempre tem algo que fica lá, de um lado para o outro na sua mente. Algo que te faz pensar em como o surpreendente consegue se colocar de forma tão nítida sem um mínimo de ruído. 
       Penso, pois, que é para não ter o perigo de não o escutarmos. 


terça-feira, 22 de abril de 2014

A linguagem do olhar.

       A gente dá tanta importância para um olhar, não é mesmo? Às vezes achamos que essa atenção para algo tão simples pode ser exagerada, ainda que às vezes tenhamos a plena certeza disso. Nunca esqueço de quando, lá na minha sétima série, eu li que os olhos eram as janelas da alma. Pensei que essa afirmação fosse um pouco sombria na época, mas não me demorei a levar essa percepção para a vida real e concluir que, na verdade, poderia sim ser, mas também não deixava de ser estonteante.
       Há pessoas que tu simplesmente não consegue olhar nos olhos por muito tempo, parece que elas te passam um sentimento tão pesado, como se fossem levar com elas a tua felicidade. Por outro lado, há outras pessoas que têm um olhar doce. Tu não consegue te privar de ficar observando a cor brilhante refletida naquelas tão pequenas íris, te parece tão certo. Não interessa a cor, desde que sejam sinceros. Não interessa que eles fechem um pouco por causa da luz forte, desde que eles ainda possam ser sentidos.
       Os olhos falam tanto por nós, o suficiente para pantomimas corporais não serem necessárias, ainda que muitas dependam deles. É quase um sentimento de ódio quando eles te entregam também, mesmo que seja por um bom motivo. Bá! E quando dois olhares se cruzam por um mesmo motivo. Chega a ser engraçado, por ora. Mexe contigo de uma forma que tu nunca podia ter imaginado que simples gesto o faria. Principalmente quando tu não esperava. Quando-tu-não-esperava! Um pouco empírica essa explicação porque acho que a maioria de nós já teve a sorte de um momento assim, um momento que tu olha para alguém apenas passando o olhar e a pessoa já estava te olhando, então ambos desviam o olhar. Simultaneamente, os dois voltam a se olhar para conferir que não está sendo mais observado e, então, os olhares se chocam. 
       Simões Lopes Neto e Machado de Assis me mostraram sutilmente como observar os olhares, pois ambos foram alertados por eles mesmo que não os tenham acreditado. Talvez com um pouco mais de sabedoria, ou talvez com um pouco mais de sutileza e desconfiança, mas principalmente me ensinaram a desfrutá-los sempre que eu achar que aquele momento tão significativo possa se tornar meu ponto de paz.
       Acho interessante que a língua portuguesa, uma língua tão rica em expressões e gramática, não tem uma expressão que fale apenas do olhar de alguém. Uma língua quase já não falada e proveniente da Terra do Fogo, por sua vez, traz essa peculiaridade de forma concisa e ela foi uma das primeiras línguas nativas da América do Sul a serem registradas por missionários europeus. Essa informação me surpreendeu porque mesmo não carregando todas as características da América, longe disso, acho que a linguagem representa um povo e sua capacidade de comunicação, então, não seria um erro total nosso tentarmos aderir palavras novas ao vocabulário da língua portuguesa brasileira a cada dia, não é? Muitos não querem isso porque acreditam que a língua portuguesa deve ser preservada, mas não digo aqui que não a preservemos, mas que simplesmente a enriqueçamos.
       A gente precisa mudar se quisermos, um dia, ser capazes de falar um palavra e significar muito.




quarta-feira, 19 de março de 2014

São tantas as tentativas.

       Apaixonei-me por alguém que não amei; amei alguém por quem não me apaixonei. Gostei de pessoas que não gostavam de mim e me desfiz de pessoas que o faziam. Esqueci alguns sobrenomes, talvez algumas fisionomias, mas nunca momentos.
       Acho que uma das grandes dificuldades da pessoa humana é diferenciar os sentimentos, na realidade. Você apenas sabe que sente e sabe que está lá, só que nunca tem a coragem de desbravar ou questionar essa angústia. Por vergonha, medo, ou por saber que o melhor mesmo é deixar assim. Emily Dickinson mesma disse que "as misérias da conjetura são uma dor mais amena do que um fato de ferro endurecido por "Eu sei". Temo em dizer que essa é uma de minhas passagens preferidas e que tem um significado tão grande. Apenas depois de uns anos daí você talvez note que aquela pessoa não era tudo que você pensava dela, mas se isso acontecer, só digo que não te frustre porque acontece. Não que as pessoas mudem, mas a tua percepção delas faz esse papel.  Não digo que será bom, mas digo que será saudável.
          Se busca um motivo para a mudança dessas opiniões antes tão certas, você pode achar um bem grande, ou vários pequenos. Um dos principais que eu encontro é que depois de um tempo que se conhecem, as pessoas acham que não existem mais limites entre elas, que não é preciso medir as palavras, nem ao menos guardar alguns mínimos segredos. Segredos estes que geralmente não passam de lembranças de um dia que você não esperava ser tão bom e decidiu guardar aquela luz emanada por ele apenas pra ti, por um momento, antes de compartilhar como foi.
       Esses detalhes, então, se repetem numa situação contrária. Muitas vezes, a pessoa pode não ter todos os "critérios" para ser alguém importante pra ti, mas você vê nela algo tão extraordinariamente único, um mistério por trás do que ela representa pra ti. Ela te faz sentir diferente, de uma forma que ninguém mais é capaz de fazer. Isso é se apaixonar. Mesmo não estando junto, mesmo não tendo tanta intimidade, tu olha para a pessoa e sabe que ficará feliz quando ela estiver também. Você talvez odiará quem ela odeia por pura empatia e sentirá por suas perdas. Não de uma forma extremista, isso nunca, mas você sabe que é assim. 
        Querer ter a pessoa por perto, achar ela bonita, querida, engraçada, é um amigo acima de tudo. Isso é gostar. Ela pode te fazer bem, te ouvir ainda que também desabafe contigo, é pegar na sua mão quando for interessante simplesmente porque é bom. O tipo de bom que também não acontece com todos. 
      Acho que agora dá pra entender por que o nosso coração simplesmente não desiste de confundir tudo.


       

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Escritos Antigos.


Escrevo para desabafar, escrevo para me confessar, escrevo para não surtar. Meu remédio de dias tristes, meu limite de dias contentes. Meu modo de não apoquentar quem eu amo com meus extremos de personalidade.
Tão chato ser trágico, tão chato ser otimista. Incomoda ser realista, estranham se lê filosofia. Pessoa, Dickinson, Sparks, Perkins e  Nietzsche, grandes amigos para dias em que uma xícara de chá com leite acompanha os mais variados pensamentos da vida corrente. Tudo muda o tempo todo e o que pensei eternizado já foi até deixado em folhas amassadas numa tarde de inverno num dos bancos da Redenção, ao lado de uma barraquinha de pipoca doce. Aquela pipoca que você saboreou enquanto comprava terrenos com dinheiro falso e seus passos eram controlados por dois dados azuis transparentes.Você era apenas um pedaço de metal.
Descobrir que ama alguém no momento em que vê ele atravessando a rua e, na sua cabeça, surge um novo assunto que gostaria de conversar, um novo abraço que gostaria de dar, mas com o mesmo perfume, gostaria de também receber. Sussurros que trazem segredos inquietantes, inexplicáveis conspirantes. Sabe mais dos seus dezesseis anos de história do que aqueles que comemoram seu aniversário do seu lado desde que se lembra ser sempre. Conhece suas manias, convive com seus medos. Consegue tirar suas angústias e te afastar da ideia do que achava que seria apenas mais um dia de tédio.
Estranho sentir o tempo tão refulgente em seus mais ultrajantes desfiles que passam enquanto somos distraídos pelo vento ou pelos próprios olhares de quem isso não entende. As cores se transfiguram e não mais é discernido aquele vulto de seriedade do seu sonho de verdade.
Talvez nada mais faça sentido e muito difícil se repita o ocorrido. Nos conformemos com o silêncio e não podemos esquecer de lembrar das palavras já escritas. As pronunciadas para sempre serão relembradas e, quem um dia ousar, recontadas, mas as escritas, se reconstruídas, se tornarão enjoativas, pobres fonemas que servem apenas de acalento ao mais conturbado contento. 


quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Acreditar, apenas.

- Mãe, isso não está certo!
- O quê, filho?
- Isso tudo que dizem sobre felicidade num relacionamento entre pobres e ingênuos adolescentes.
- Olha a ironia de novo. Como assim, querido?
- Ah, mãe, eu achava que era bem mais fácil. Sou uma pessoa que vai direto ao ponto, mas daí dizem que também perde a graça, então me sinto perdido.
       Assim se começou a conversa entre meu primo, de seus 17 anos na época, com a minha tia, no caso mãe dele. Era aniversário do meu tio e estávamos todos na casa deles para a comemoração. Ventava muito e minha tia estava na cozinha fazendo pipocas para as crianças presentes. Eu acabei indo junto para ajudar e meu primo já estava lá sentado mexendo no celular.
- Miguel, pode falar, o que está acontecendo contigo?
- Vamos criar uma situação hipotética de que eu estaria gostando de alguém...
- Com quem, no caso, estaria trocando mensagens no celular agora.
- Cala a boca, Hannah! Mãe, - e ele virou o rosto para ela - só que eu não soubesse absolutamente nada que essa garota pensa, nada mesmo, como eu deveria reagir?
- Se tu conhece ela há um tempo, acho que o mínimo que tu deveria saber é como essa garota faz suas decisões em relação a qualquer assunto. Desde o colégio em que estuda até músicas que gosta. Não que isso seja relevante, mas é que é um assunto para se ter, né! E uma forma de mostrar que se importa com a forma que leva a vida.
- Hm, e se eu comecei a falar com ela há uns meses e a gente já saiu algumas vezes, mas ela não se mostra muito interessada embora sempre se mostre muito disposta?
- Tu saiu com ela, filho? Em que tempo?
- Aaaahh, que tu vai me dar o nome dela pra eu saber quem é!
- Hannah! Shiu! Saí, umas três ou quatro vezes. 
- Tá, parei, tô só achando bonitinho. Continue, Mimi.
- Já disse pra não me chamar assim. Tá, tanto faz agora. Mãe?
- Bom, aí depende muito do que tu pretende ter com essa moça.
- Ah, mãe, eu gosto realmente dela, mas tenho medo de fazer qualquer objeção ou sei lá. Parece que estou em constante observação e ela parece tão madura pra uma guria de quinze anos. Às vezes, me sinto um retardado falando com ela.
- E tu já parou pra pensar que ela também pode ter essa mesma sensação?
- Impossível! Ela é muito segura.
- Ué, pode parecer. Tu mesmo disse que não sabia o que se passava na cabeça dela.
- Ah, é diferente, eu acho.
- Não me venha com "é diferente, eu acho", não é diferente. Os sentimentos das pessoas podem ser um tanto complicados, seja por medo e precaução, seja pelo simples fato de não querer perder o foco por mais que queira que algo diferente aconteça.
- Primo, vou te falar. Tenho muitas amigas agora nessa fase inicial de relacionamento e elas têm muito medo de apostar em algo que será perda de tempo. Talvez a...
- Anna. - ele disse olhando para os dedos que tamborilavam na mesa.
- Talvez a Anna também se sinta assim e queira apenas que tu mostre que merece pelo menos parte do tempo dela que, convenhamos, se ela é tão "madura" como tu diz, deve ser precioso.
- Tu tem só dezesseis anos, não sei se deveria acreditar em ti.
- Dezesseis anos de muita pesquisa, com licença. Tia, conversa com ele e deixa que eu mexo a panela.
- Obrigada, cuida pra não se queimar! Miguel, escuta. A Hannah tinha lá seu fundo de razão. - fiz uma careta para ele na hora, que sorriu - Não conheço essa tal de Anna, e é melhor eu conhecer logo, mas acho que ela realmente procura essa iniciativa por tua parte. Ela pode talvez dar algumas indiretas que tu tem que saber entender, não passa de um jogo que ambos querem, de certa forma, ganhar. Além disso, ela tem 15, tu tem 17, é teu dever tomar essa responsabilidade.
- Não que seja totalmente obrigatório, mas mostre que se importa. Isso é o mais importante.
- Mande flores!
- Não, tia, isso não! Ela pode não gostar, ou ser alérgica também. Espere conhecer ela melhor para fazer isso.
- Hannah - chamou Miguel, embora não tivesse levantado o olhar ainda - é provável que tu possa saber isso.
- Como?
- Bom, lembra da Anna que viajou contigo janeiro passado?
- Ai, meu Deus! Aquela Anna? Miguel!!
- Ai, Hannah, acontece!
- Acontece? Eu vou te dar uns tapas...
- Cuida que tá começando a estourar os milhos. - Disse a minha tia quando eu virei de costas para o fogão. - Mas o que tem ela, Hannah?
- Tia, o que ele disse é verdade. Ela é realmente muito "mãe" pra idade dela.
- Exatamente! - Miguel concordou.
- Filho, então tenho poucos conselhos para te dar. - minha tia arrumou o cabelo, colocou uma mão na cintura e apontou para o Miguel e digamos que até eu temi naquele momento - Mostre que se importa com ela, não fique dando essas crises existenciais porque esse tipo de garota não é de ficar se fazendo por aí. Se ela já mostrou que gosta de ti em um dia e não fez nada que ateste o contrário, continue confiante. Todavia, não seja aquele tipo de cara grudento também, só o suficiente. Faça ela rir e não torne insignificante algo que ela pensa ser especial. Ah, e o mais importante, se apaixone, porque é saudável, mas não idealize, porque decepciona. Acho que é só isso por enquanto.
       As palavras da minha tia me surpreenderam e marcaram tanto que eu me recordo daquela luz branca da cozinha e do cheiro daquela pipoca com manteiga até hoje, mesmo um ano depois. Eu pensei, naquela noite, se não responderia diferentemente as perguntas do Miguel se tivesse mais tempo para pensar, assim como sempre tenho respostas melhores para as perguntas feitas só depois, quando eu já respondi a primeira vez e ficaria sem sentido "responder" de novo. Felizmente, não encontrei palavras diferentes. Minha tia foi sábia em falar de paixão e idealização, nunca tinha pensado daquela forma, mas faz muito sentido agora.
          Conto tudo isso porque reencontrei, semana passada, o Miguel e ele apenas disse:
- Obrigado, pirralha!
- Tu vai ver a pirralha, Mimi.
- Ai, como eu te odeio!
- Disponha.
           A quem interessar, Miguel e Anna ficaram mais umas duas semanas naquela angústia de não saber o que fazer, mas decidiram tentar. Estão juntos há nove meses e, mesmo com alguns percalços da faculdade e brigas por bocabertices, sentem-se, no mínimo, felizes e deveras focados. Digo isso como se fosse algo muito grandioso, não é!? Bom, para eles é, então, por que acabar com a emoção de uma história toda?